MOÇÃO DE APOIO AOS ESTUDANTES SECUNDARISTAS PELO RETORNO DO CURSINHO PRÉ-VESTIBULAR DA UFSC

O coletivo Barricadas Abrem Caminhos, vem por meio desta moção declarar apoio a construção da luta dos estudantes secundaristas da rede de ensino público de Santa Catarina, através da reinvindicação para que o Governo de Santa Catarina– Raimundo Colombo, mantenha o convênio juntamente a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a parceira foi decorrente a expansão a 31 cidades do Estado, com cerca de 3.000 mil alunos.

O cursinho pré-vestibular da UFSC têm aprovado cerca de 65% de alunos no vestibular, abrindo oportunidade aos estudantes oriundos de escolas públicas e de baixa renda a ingressarem na universidade, sabemos que o sistema educacional é falho devido a desvalorização dos educadores e ausência de investimentos no setor público, desta maneira a política de cotas não supre a demanda de estudantes ingressarem na universidade, nem a melhoria da educação no secundário.
O secretário da educação, Eduardo Dechamps declara que o governo não participará da parceira neste primeiro semestre, devido a necessidade de reorganizar o investimento da pasta por conta do reajuste da folha de pagamento dos professores. Além dos gastos de infraestrutura das escolas. Assim, de modo geral o secretário da educação culpabiliza os trabalhadores da área educacional pelo corte de 3 milhões do convênio entre a UFSC e o Governo Estadual, recurso viabilizado aos alunos provenientes de escolas públicas, uma tentativa absurdo de colocar os estudantes contra os trabalhores, ao passo é essencial que ambas categorias estejam lado a lado na luta pela educação, pois ambas tem sido prejudicadas aos ataques do Governo Colombo.
Em tempos de diversos ataques à educação pública por parte do Governo, aos quais avançam em processo de sucateamento e mercatilização da educação brasileira, é de extrema importância a iniciativa dos secundaristas organizarem um movimento estudantil combativo a essas políticas que ameaçam a classe trabalhadora e estudantes de baixa renda.
Por isso vemos a importância e a necessidade dos estudantes secundaristas se organizarem através de grêmios estudantis que atuam de forma aberta e sem intervenções da direção nas escolas para legimitimar suas reinvindicações e garantir direitos, aos quais são historicamente conquistados pelo movimento estudantil através da resistência estudantil e dos trabalhadores da educação conseguiremos avanços na educação que vem a cada momento sendo precarizada pelas políticas de caráter neoliberal.

“Ou os estudantes se identificam com o destino do seu povo, com ele sofrendo a mesma luta, ou se dissociam do seu povo, e nesse caso, serão aliados daqueles que exploram o povo”. Florestan Fernandes

CAMPO BARRICADAS ABREM CAMINHOS
barricadas.floripa@gmail.com

Algo de novo no reino das Universidades Federais?

por Marcelo Badaró Mattos – professor da UFF

            São muitas vezes surpreendentes os caminhos que levam a movimentos coletivos como as greves. Quem poderia prever que depois de sete anos sem qualquer greve nacional unificada as Instituições Federais de Ensino Superior viveriam uma nova greve nacional e com tanta força que recebeu em poucos dias a adesão dos(as) docentes de 44 instituições, incluindo praticamente todas as que foram criada nesses últimos anos e a maior parte das grandes federais mais antigas, como a UFRJ, UFF, UNIRIO e UFRRJ (para ficar no exemplo das do Rio de Janeiro)?  Quem poderia dizer que nas novas instituições e nos novos campi das antigas, fruto do tão propagandeado processo de expansão formatado pelas regras do REUNI*, surgiriam os setores docentes e discentes mais mobilizados para esse enfrentamento? Como imaginar que até naquelas instituições em que surgiu e implantou-se uma representação docente de caráter oficialista – o PROIFES –, cujo objetivo evidente é conter as lutas da categoria, fossem ressurgir movimentos autônomos das(os) docentes, convocando assembleias, contrariando direções pelegas e construindo também lá a mobilização (e ao que parece em breve a greve)? Quem apostaria que nas Instituições Federais de Ensino Superior, que por certo forneceram muitos votos ao atual governo federal na expectativa de manutenção da política de expansão e dos reajustes salariais anuais, tão forte e resoluta fosse a adesão a um movimento acusado pelo governo e os governistas de ser fruto de uma mera manipulação política de setores oposicionistas?

            A dinâmica dos conflitos sociais nos reserva surpresas, mas não nos dispensa de compreendê-las. Porque uma greve tão forte emergiu nestes últimos dias?

            Para entendê-lo é necessário reconhecer que a pauta do movimento, curta e direta, representa de fato uma forte insatisfação. A pauta: uma reestruturação da carreira docente e a melhoria das condições de trabalho. Sobre a carreira, a questão é simples: após 25 anos de aprovação do Plano Único que passou a reger a carreira docente, em 1987, sucessivas políticas salariais para a Universidade depreciaram e desestruturaram a carreira. O que se reivindica é, basicamente, uma única linha de vencimento nos contracheques (com a incorporação das gratificações e o entendimento do percentual de titulação como parte do vencimento), com 13 níveis, steps (percentuais entre os níveis) de 5%, acesso interno à carreira ao nível de Professor Titular, com paridade entre ativos e aposentados e isonomia entre professores(as) da carreira do magistério superior e da carreira de ensino básico, técnico e tecnológico. O piso para professor 20h no início da carreira seria de R$ 2.329,35 (um salário mínimo do DIEESE, calculado com base nas necessidades mínimas de um trabalhador e sua família, conforme dita a Constituição). O governo acena com uma carreira mais desequilibrada em termos salariais, com um piso baixíssimo e promoções atreladas a critérios produtivistas, visando diferenciar um pequeno contingente melhor remunerado (por projetos e pela atuação em pós-graduações) e uma imensa maioria de docentes sobrecarregados com a elevação da carga de trabalho em sala de aulas de graduação. Já quanto às condições de trabalho, cinco anos após o início do REUNI, as instituições federais criaram centenas de novos cursos e ampliaram em dezenas de milhares as suas vagas de ingresso discente.  O governo, entretanto, não garantiu até agora nem mesmo o relativamente (à ampliação das matrículas) pequeno número de concursos públicos para docentes com o qual se comprometeu em 2007. As obras de expansão carecem de verbas para sua complementação, gerando ausência de laboratórios, bibliotecas e salas de aula nas novas unidades, assim como superlotação nas antigas. Some-se a isso a enorme deficiência no campo da assistência estudantil, cada vez mais necessária na medida em que entre os novos estudantes tendem ingressar contingentes cada vez maiores de trabalhadores(as) e filhos(as) de trabalhadores(as), sem condições de arcar com os custos de transporte, moradia, alimentação e material didático minimamente necessários para a vida universitária.

            A greve pode ter colhido a muitos(as) de surpresa, mas está longe de ser um fenômeno de difícil explicação. Professores e professoras (e estudantes que aderem ao movimento em muitas universidades) optaram por esse instrumento de luta porque estão conscientes de sua necessidade diante da deterioração de sua carreira e das condições de trabalho. E perceberam que ou freiam agora o desmonte, ou serão arrastados ao fundo do poço em poucos anos.

Greve?

            Tão logo a greve foi anunciada, surgiram de imediato combatentes antigreve no interior das Universidades. Seus argumentos não são novos para quem já viveu outros processos grevistas. Vale rebatê-los apenas para relembrar aspectos do passado recente das lutas em defesa da Universidade Pública que podem escapar aqueles(as) que  a elas se integraram nos últimos anos.

            Greves paralisam só as graduações e prejudicam apenas os estudantes de graduação? Tal argumento foi usado principalmente a partir dos anos 2000, quando a pressão das agências financiadoras/avaliadoras sobre as pós-graduações para cumprirem metas produtivistas gerou um núcleo de docentes que assumiu internamente (ou como membros de comitês das agências) o papel de feitores da produtividade coletiva, alardeando o pânico dos prazos e metas ante qualquer rumor de questionamento. As greves tradicionalmente pararam aulas de graduações e pós e podem continuar a fazê-lo. Prejudicam os estudantes? Momentaneamente prejudicam estudantes, professores e técnico-administrativos que as fazem, é óbvio, mas significam justamente o sacrifício de um calendário regular de atividades (com os prejuízos materiais e pessoais que isso pode representar) em nome de um projeto maior de Universidade Pública. Assim evitamos a cobrança das mensalidades, com a greve de 1982; garantimos os direitos dos professores precariamente contratados ao longo da ditadura, com as greves da primeira metade dos anos 1980; conquistamos a isonomia entre instituições fundacionais e autárquicas e a carreira docente, com a greve de 1987;  descongelamos as vagas para concursos docentes, com a greve de 2001; barramos ou derrubamos diversas propostas e práticas desastrosas para o caráter público e a qualidade do trabalho universitário (projeto GERES; propostas de “regulamentação” da autonomia; efeitos da reforma do Estado; carreira de “emprego público”; gratificações produtivistas, quebras de isonomia e paridade e etc.),  e preservamos minimamente os salários (que ainda assim perderam muito do seu valor de compra ao longo dos anos). Estivemos longe de fazer greves meramente corporativistas, pois sempre pautamos a garantia da qualidade do trabalho de ensino, pesquisa e extensão nas universidades, o que foi sempre reconhecido pelos(as) estudantes, muitas vezes com greves conjuntas, como a que já ocorre agora em diversas universidades. Seriam os(as) estudantes tolos(as), que apoiam algo que lhes prejudica tanto assim? Ou o discurso que os vitimiza em relação à greve é apenas uma artimanha de desqualificação do movimento e da consciência estudantil?

            Desqualificar as mobilizações de trabalhadores e de estudantes, qualificando-as como produto de minorias e forças “estranhas” (partidos, sindicatos, intenções políticas oposicionistas) ao corpo social – universitário neste caso –, é aliás uma das estratégias recorrentes nos argumentos antigreve dos setores conservadores. Um recurso retórico em tudo congruente com a longa trajetória de desqualificação da população trabalhadora pelo discurso das classes dominantes, que no Brasil sempre apontaram as “ideologias alienígenas” (anarquistas, comunistas, sindicalistas, ou o que seja) como responsáveis pelas perturbações à ordem, através da “manipulação” de grupos tomados como “massas de manobra”, enquanto a maioria do “povo” – “ordeiro e pacífico” (claro!) – assistiu a tudo indiferente, quando não “bestializado”. Teriam tanta força nas Universidades Federais dois ou três partidos de oposição de esquerda ao governo, que juntos somaram cerca de 1% na última eleição, para manipularem segundo seus interesses políticos dezenas de milhares de docentes? São as(os) docentes universitárias(os) tão parvos assim? E as(os) estudantes também? Se o Sindicato Nacional é tão carente de representatividade, por que reúne um contingente tão significativo de associados em suas sessões sindicais? Porque assembleias supostamente “ilegítimas” reúnem cada uma centenas de professores(as), que trocam informações, avaliam a situação, discutem e se posicionam coletivamente? Por certo que o questionamento à legitimidade vem sempre acompanhado de tentativas de profecias auto-realizáveis: “não vou à assembleia porque ela é ilegítima e tem pouca participação” (e não indo, contribui-se para fazer menor a participação e assim arguir sua legitimidade). O que vem muitas vezes acompanhado de uma fala ainda mais autocentrada de questionamento dos espaços coletivos de deliberação, não por cercearem a palavra, mas por aprovarem posturas contrárias às do indivíduo que questiona: “Já fui muito, mas desisti, pois o espaço é antidemocrático, já que toda vez que falei contra a greve perdi as votações”.

            Há argumentos mais falaciosos, como o de que as greves não geram resultado algum ou que esvaziam a Universidade dificultando o debate e a mobilização, ou ainda que docentes recebemseus salários quando fazem greve. Difícil tomá-los como simples fruto de diferentes visões políticas, pois falseiam a realidade. A história das greves docentes está sendo cada vez mais pesquisada e diversos trabalhos acadêmicos já fizeram o balanço e avaliaram a importância desses movimentos nas últimas três décadas. Um quadro sintético dos resultados das greves nas Instituições Federais pode ser consultado em http://www.sedufsm.org.br/index.php?secao=greve. As greves sempre potencializaram o debate – interno às Universidade e público – sobre as políticas para o ensino superior no país e parar a atividade universitária é o único meio de garantir mobilizações multitudinárias nas ruas. Que debate sobre o ensino superior estão fazendo os antigreve em suas aulas cotidianas? De que mobilizações em defesa da Universidade Pública estão participando enquanto dão suas aulas? Já quanto aos salários, não seria absurdo que o direito de greve fosse respeitado e os salários pagos, mas todos(as) se lembram de como em diversas greves que ultrapassaram um mês de duração os salários foram cortados (cuidado! O governo corta os salários de todo mundo, inclusive dos(as) que continuam dando aulas!), como na greve de 2001, em que dois meses foram sucessivamente cortados e só pagos depois que as mobilizações da greve arrancaram decisões judiciais favoráveis em meio a “guerras de liminares”.

            Não é difícil entender as motivações dos(as) que se propõem a furar uma greve (fura-greves  pode ser um “conceito nativo” com conotação negativa, como pelego, mas é compartilhado por todos os estudiosos dos fenômenos grevistas nas Ciências Humanas e Sociais, porque corresponde ao que expressa). Em alguns casos, acomodam-se a – e reproduzem – determinadas situações de poder; em outros estão por demais enredados em mecanismos de apropriação privada de recursos através da Universidade Pública (como cursos pagos e consultorias); algumas vezes apenas estão aferrados a defesa do governo de “seu” partido. Outras vezes, um pouco de tudo isso está presente.

Fazer a greve

            As respostas mais significativas aos antigreve sempre foram construídas pelos próprios movimentos e seus resultados objetivos. Não se trata de docentes que não aprenderam com as lições do passado, mas de deliberada retomada de argumentos desgastados para marcar posição e construir a rede de reverberação interna às arengas conservadoras tradicionais dos governos e da mídia. No entanto, greves fortes e participativas, como esta está se desenhando desde o começo, atropelam sem maiores problemas tais tentativas de deslegitimação da luta coletiva.

            Não há como prever os resultados finais da greve, mas desde já se podem perceber algumas conquistas significativas. Docentes e estudantes que ingressaram nos últimos tempos nas Universidades participam ativamente de um movimento coletivo e sentem-se parte de uma comunidade universitária que pode sim atuar unida em torno de pautas comuns. No reino do individualismo, da concorrência e do produtivismo, ouve-se um coro de vozes falando como uma só, fazendo ecoar cantos de solidariedade, dignidade, coletividade e consciência de classe.

            Nessa toada – de uma greve apoiada pela maioria da categoria dada a justiça de suas reivindicações e que ganha do apoio à adesão dos estudantes pelo aspecto da defesa da Universidade Pública e da qualidade do ensino – estamos diante da construção de um movimento suficientemente forte para gerar repercussão pública, apoio social e, com essas condições, dobrar o governo e garantir ganhos efetivos. Transformar esse potencial em realidade é o que nos cabe a partir de agora.


*             O Reuni é um programa de expansão, instituído em 2007 por decreto pelo governo Lula da Silva, que previa (mas não garantia) um pequeno aporte de novos recursos para investimentos nas universidades federais e alguns concursos para novos docentes em troca da expansão de vagas/matrículas/cursos para estudantes em até o dobro das existentes, cumprimento de metas de produtividade (elevação da relação professor-aluno e do percentual de formados entre os ingressantes) e a conversão dos novos cursos superiores num modelo de formação mais rápida, em dois ou três anos e sem habilitação profissional precisa.

O GOVERNO DILMA, A GREVE NACIONAL DOS DOCENTES E A UNIVERSIDADE DE SERVIÇOS

Roberto Leher (professor de educação da UFRJ)

A longa sequencia de gestos protelatórios que levaram os docentes das IFES a uma de suas maiores greves, alcançando 48 universidades em todo país (28/05), acaba de ganhar mais um episódio: o governo da presidenta Dilma cancelou a reunião do Grupo de Trabalho (espaço supostamente de negociação da carreira) do dia 28 de maio que, afinal, poderia abrir caminho para a solução da greve nacional que já completa longos dez dias. Existem algumas hipóteses para explicar tal medida irresponsavelmente postergatória:

(i) a presidenta – assumindo o papel de xerife do ajuste fiscal – cancelou a  audiência pois, em virtude da crise, não pode negociar melhorias salariais para os docentes das universidades, visto que a situação das contas públicas não permite a reestruturação da carreira pretendida pelos professores;

(ii) apostando na divisão da categoria, a presidenta faz jogral de negociação com uma organização que, a rigor, é o seu espelho, concluindo que logo os professores, presumivelmente desprovidos de capacidade de análise e de crítica, vão se acomodar com o jogo de faz de conta, o que permitiria o governo Dilma alcançar o seu propósito de deslocar um possível pequeno ajuste nas tabelas para 2014, ano que os seus sábios assessores vindos do movimento sindical oficialista sabem que provavelmente será de difícil mobilização reivindicatória em virtude da Copa Mundial de Futebol, “momento de união apaixonada de todos os brasileiros”, e

(iii) sustentando um projeto de conversão das universidades públicas de instituições autônomas frente ao Estado, aos governos e aos interesses particularistas privados em organizações de serviços, a presidenta protela as negociações e tenta enfraquecer o sindicato que organiza a greve nacional para viabilizar o seu projeto de universidade e de carreira que ‘resignificam’ os professores como docentes-empreendedores, refuncionalizando a função social da universidade como organização de suporte a empresas, em detrimento de sua função pública de produção e socialização de conhecimento voltado para os problemas lógicos e epistemológicos do conhecimento e para os problemas atuais e futuros dos povos.

Em relação a primeira hipótese, a análise do orçamento 2012[1] evidencia que o gasto com pessoal segue estabilizado em torno de 4,3% do PIB, frente a uma receita de tributos federais de  24% do PIB. Entretanto, os juros e o serviço da dívida seguem consumindo o grosso dos tributos que continuam  crescendo acima da inflação. Com efeito, entre 2001 e 2010 os tributos cresceram 265%, frente a uma inflação de 90% (IPCA). Conforme a LDO para o ano de 2012, a previsão de crescimento da receita é de 13%, porém os gastos com pessoal, conforme a mesma fonte, crescerá apenas 1,8% em valores nominais. O corte de R$ 55 bilhões em 2012 (mais de 22% das verbas do MCT) não é, obviamente, para melhorar o Estado social, mas, antes, para seguir beneficiando os portadores de títulos da dívida pública que receberam, somente em 2012, R$ 369,8 bilhões (até 11/05), correspondente a 56% do gasto federal[2]. Ademais, em virtude da pressão de diversos setores que compõem o bloco de poder, o governo Federal está ampliando as isenções fiscais, como recentemente para as corporações da indústria automobilística, renúncias fiscais que comprovadamente são a pior e mais opaca forma de gasto público e que ultrapassam R$ R$ 145 bilhões/ano. A despeito dessas opções em prol dos setores dominantes, algumas carreiras tiveram modestas correções, como as do MCT e do IPEA. Em suma, a hipótese não é verdadeira: não há crise fiscal. Os governos, particularmente desde a renegociação da dívida do Plano Brady (1994), seguem priorizando os bancos e as frações que estão no núcleo do bloco de poder (vide financiamento a juros subsidiados do BNDES, isenções para as instituições de ensino superior privadas-mercantis etc.). Contudo, os grandes números permitem sustentar que a intransigência do governo em relação a carreira dos professores das IFES não se deve a falta de recursos públicos para a reestruturação da carreira. São as opções políticas do governo que impossibilitam a nova carreira.

Segunda hipótese. De fato, seria muita ingenuidade ignorar que as medidas protelatórias objetivam empurrar as negociações para o final do semestre, impossibilitando os projetos de lei de reestruturação da carreira, incluindo a nova malha salarial e a inclusão destes gastos públicos na LDO de 2013. O simulacro de negociações tem como atores principais o MEC, que se exime de qualquer responsabilidade sobre as universidades e a carreira docente, o MPOG que defende a conversão da carreira acadêmica em uma carreira para empreendedores e, como coadjuvante, a própria organização pelega que faz o papel dos truões, alimentando a farsa do jogral das negociações.

Terceira hipótese. É a que possui maior lastro empírico.  As duas hipóteses anteriores podem ser compreendidas de modo mais refinado no escopo desta última hipótese. De fato, o modelo de desenvolvimento em curso aprofunda a condição capitalista dependente do país, promovendo a especialização regressiva da economia. Se, em termos de PIB, os resultados são alvissareiros, a exemplo dos indicadores de concentração de renda que alavancam um seleto grupo de investidores para a exclusiva lista dos 500 mais ricos do mundo da Forbes, o mesmo não pode ser dito em relação a educação pública.

Os salários dos professores da educação básica são os mais baixos entre os graduados[3] e, entre as carreiras do Executivo, a dos docentes é a de menor remuneração. A ideia-força é de que os docentes crescentemente pauperizados devem ser induzidos a prestar serviços, seja ao próprio governo, operando suas políticas de alívio à pobreza, alternativa presente nas ciências sociais e humanas ou, no caso das ciências ditas duras, a se enquadrarem no rol das atividades de pesquisa e desenvolvimento (ditas de inovação), funções que a literatura internacional comprova que não ocorrem (e não podem ser realizadas) nas universidades[4]. A rigor, em nome da inovação, as corporações querem que as universidades sejam prestadoras de serviços diversos que elas próprias não estão dispostas a desenvolver pois envolveriam a criação de departamentos de pesquisa e desenvolvimento e a contratação de pessoal qualificado. O elenco de medidas do Executivo que operacionaliza esse objetivo é impressionante: Lei de Inovação Tecnológica, institucionalização das fundações privadas ditas de apoio, abertura de editais pelas agencias de fomento do MCT para atividades empreendedoras. Somente nos primeiros meses deste ano o Executivo viabilizou a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, um ente privado, que submete os Hospitais Universitários aos princípios das empresas privadas e aos contratos de gestão preconizados no plano de reforma do Estado (Lei nº. 12.550, 15 de dezembro de 2012), a Funpresp (Fundação de Previdência Complementar dos Servidores Públicos Federais), que limita ao teto de R$ 3.916,20, medida que envolve enorme transferência de ativos públicos para o setor rentista e que fragiliza, ainda mais, a carreira dos novos docentes, pois, além de não terem aposentadoria integral, não possuirão o FGTS, restando como última alternativa a opção pelo empreendedorismo que ilusoriamente (ao menos para a grande maioria dos docentes) poderia assegurar algum patrimônio para a aposentadoria. Ademais, frente à ruina da infraestrutura, os docentes devem captar recursos por editais para prover o básico das condições de trabalho. Por isso, nada mais coerente do que a insistência do Executivo em uma carreira que converte os professores em empreendedores que ganham por projetos, frequentemente ao custo da ética na produção do conhecimento[5].

Os operadores desse processo de reconversão da função social da universidade pública e da natureza do trabalho e da carreira docentes parecem convencidos de que já conquistaram os corações e as mentes dos professores e por isso apostam no impasse nas negociações. O alastramento da greve nacional dos professores das IFES, o vigoroso e emocionante apoio estudantil a essa luta sugerem que os analistas políticos do governo Federal podem estar equivocados. A adesão crescente dos professores e estudantes ao movimento comprova que existe um forte apreço da comunidade acadêmica ao caráter público, autônomo e crítico da universidade. E não menos relevante, de que a consciência política não está obliterada pela tese do fim da história[6]. A exemplo de outros países, os professores e os estudantes brasileiros demonstram coragem, ousadia e determinação na luta em prol de uma universidade pública, democrática e aberta aos desafios do tempo histórico!

Rio de Janeiro, 27 de maio de 2012


[4] Mansfield, Edwin 1998 Academic research and industrial innovation: An update of empirical findings em Research Policy 26, p. 773–776.
 [5] Charles Ferguson, A corrupção acadêmica e a crise financeira, disponível em: http://noticias.bol.uol.com.br/economia/2012/05/27/a-corrupcao-academica-e-a-crise-financeira.jhtm
[6] . Marcelo Badaró Mattos, Algo de novo no reino das Universidades Federais?

Professores em greve!

O coletivo Barricadas Abrem Caminhos apoia a greve dos professores das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e, portanto, divulga abaixo a Carta À Sociedade Brasileira escrita pelo Comando Nacional de Greve.

Por que os (as) professores(as) das Instituições Federais estão em greve?

A defesa do ensino público, gratuito e de qualidade é parte essencial da história do Sindicato Nacional das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN), assim como a exigência da população brasileira, que clama por serviços públicos, com qualidade, que atendam às suas necessidades de saúde, educação, segurança, transporte, entre outros direitos sociais básicos.

Os(as) professores(as) federais estão em greve em defesa da Universidade Públi-ca, Gratuita e de Qualidade e de uma carreira digna, que reconheça o importante papel que os docentes têm na vida da população brasileira.

O governo vem usando seguidamente o discurso da crise financeira internacional como justificativa para cortes de verbas nas áreas sociais e para rejeitar todas as demandas feitas pelos servidores públicos federais por melhores condições de trabalho, remuneração e, consequentemente, qualidade no serviço público.

A situação provocada pela priorização de investimentos do Estado no setor empresarial e financeiro causa impacto no serviço público, afetando diretamente a população que dele se beneficia.

Pela reestruturação da carreira

Há anos os(as) professores(as) vêm lutando pela reestruturação do Plano de Carreira da categoria, por acreditarem que essa reivindicação valoriza a atividade docente e, dessa forma, motiva a entrada e permanência dos profissionais nas instituições federais de ensino. No ano passado, o ANDES-SN assinou um acordo emergencial com o governo, que previa, como um dos principais pontos, a reestruturação da carreira até 31 de março de 2012. Já estamos na segunda quinzena de maio e nada aconteceu em relação a essa reestruturação.

Para reestruturação da carreira atual, desatualizada e desvirtuada conceitualmente pelos sucessivos governos, o ANDES-SN propõe uma carreira com 13 níveis, variação remuneratória de 5% entre níveis, a partir do piso para regime de trabalho de 20 horas, correspondente ao salário mínimo do DIEESE (atual¬mente calculado em R$2.329,35) A valorização dos diferentes regimes de tra¬balho e da titulação devem ser parte integrante de salários e não dispersos em forma de gratificações.

Pela melhoria das condições de trabalho nas Instituições Federais

O começo do ano de 2012 evidenciou a precariedade de várias instituições. Diversos cursos em Instituições Federais de Ensino – IFE tiveram seu início sus¬penso ou atrasado devido à precariedade das Instituições.
O quadro é muito diferente do que o governo noticia. Existem instituições sem professores, sem laboratórios, sem salas de aula, sem refeitórios ou restaurantes universitários, até sem bebedouros e papel higiênico, afetando diretamente a qualidade do ensino.

Ninguém deveria ser submetido a trabalhar, a ensinar ou a aprender num ambiente assim. Sofrem professores, estudantes e técnicos administrativos das Insti-tuições Federais de Ensino. E num olhar mais amplo, sofre todo o povo brasileiro, que utilizará dos serviços de profissionais formados em situações precárias e que, se ainda não têm, pode vir a ter seus filhos estudando nessas condições.

Por isso convidamos todos a se juntarem à nossa luta. Essa batalha não é só dos(as) professores(as), mas de todos aqueles que desejam um país digno e uma educação pública, gratuita e de qualidade. (Comando Nacional de Greve)

Tese Rompendo Amarras ao II Seminário de Direitos Humanos da FENED

Contribuição escrita pelos coletivos Barricadas abrem Caminhos e Domínio Público  ao II Seminário de Direitos Humanos, organizado pela Federação Nacional de Estudantes de Direito, dias 18, 19 e 20 de maio, no Rio de Janeiro.

http://pt.calameo.com/read/0008866000a40d9d20681

Nota de Apoio à Chapa 1 UENP – ME Sonhar é preciso, acordar é primordial!!

O Coletivo Nacional Barricadas Abrem Caminhos vem dar total apoio à Chapa 1 UENP-ME pra a primeira eleição para o DCE da Universidade Estadual do Norte do Paraná, representando um momento histórico para o movimento estudantil da UENP, por um DCE combativo que unifique politicamente os três campi da universidade: Cornélio Procópio, Jacarezinho e Luiz Meneghel.

 

Damos apoio à toda a construção que já vem de algum tempo dos estudantes de variados cursos da UENP, na tentativa de colocar em pauta problemas centrais que vivenciamos hoje, como a falta de canais de diálogo entre os estudantes e os demais setores da universidade, o debate restrito sobre as condições da própria universidade em si, a ausência de eventos culturais e esportivos, a cobrança de diversas taxas, o abuso de preço em um Restaurante Universitário que não é para todos e que demonstra a falta da concepção de uma política de permanência estudantil que veja a educação como um direito e não como um serviço prestado pelo Estado. E neste mesmo sentido, a ausência também de uma casa dos estudantes que contemple todas as necessidades da realidade dos estudantes da UENP.
Nesse sentido, ressaltamos nosso apoio à Chapa 1, que está se propondo, através de sínteses coletivas, a reorganizar o movimento estudantil combativo da UENP, estimulando a organização dos Centros Acadêmicos, se propondo ao diálogo e apresentando propostas concretas para a universidade. Neste cenário nacional e estadual, em que temos enfrentado sérios cortes de verba, é necessário que estejamos organizados em conjunto, para reforçar nossa luta na construção de uma universidade pública, que permita o desenvolvimento de uma educação de boa qualidade e que seja verdadeiramente gratuita.
Nossos sinceros cumprimentos à organização dos estudantes que apoiam e constroem a Chapa 1!! Estamos juntos nessa luta!!

 

Coletivo Nacional Barricadas Abrem Caminhos

DENÚNCIA: Fraude nas eleições do DCE UFC

Reproduzimos abaixo a carta escrita por membros e apoiadores da Chapa Mais Vale o que Será para o DCE da UFC esclarecendo como se deu o processo de apuração dos votos, bem como explicitando os elementos que levam a acreditar que houve fraude em urnas.

Todo apoio aos camaradas da UFC!

 

Carta Aberta aos Estudantes da UFC

“E o que foi feito é preciso conhecer para melhor prosseguir
Falo assim sem tristeza, falo por acreditar
Que é cobrando o que fomos
Que nós iremos crescer”

Mais de 8 mil estudantes da Universidade Federal do Ceará, entre os dias 23, 24 e 25 de abril,  construíram as eleições para o Diretório Central dos Estudantes (DCE) e Representantes Discentes (RD´s) nos Conselhos Superiores da UFC (CONSUNI, CEPE, CONCUR). Enquanto membros e apoiadores/as da Chapa 1 – “Mais Vale o que será” – parabenizamos todos e todas que participaram desse processo eleitoral com a consciência de que é através do movimento estudantil que podemos transformar a nossa universidade.

O movimento de esquerda nessa universidade não se iniciou com uma eleição. Começa e recomeça todos os dias nas salas de aula e em cada espaço em que defendemos uma Universidade que seja pública, gratuita, socialmente referenciada e de qualidade. Tal defesa pressupõe fundamentalmente a construção de um movimento estudantil que seja combativo e que não baixe a cabeça para a Reitoria ou para os Governos Municipal, Estadual ou Federal, estando, portanto, sempre presente nas lutas dos trabalhadores/as dentro e fora universidade, lutando contra a privatização dos direitos sociais, através da defesa da educação como um direito a ser garantido pelo Estado e não como uma mercadoria. Assim, é preciso, com contundência, dizer que houve dois projetos diferentes de Universidade colocados em questão nesse processo eleitoral, representados, cada um, por cada uma das duas chapas.

Apresentamos nossas propostas para os campi, debatemos com os/as estudantes, comparecemos aos espaços convocados pela Comissão Eleitoral, distribuímos nosso material em cada espaço desta Universidade. Dialogando com os/as estudantes, deixamos claro que existe sim uma proposta de universidade que contemple nossos anseios enquanto agentes da transformação social. Somos a favor, sim, da expansão da universidade, mas não abrimos mão de recursos, infraestrutura, educação de qualidade, professores em regime de dedicação exclusiva (DE). Não aceitamos o discurso do “menos pior”!. Discutimos as lotações nos ônibus do Pici, a ausência de Democracia na Universidade, as constantes filas no R.U, os problemas cotidianos que afetam o corpo estudantil da UFC. Não retrocedemos um só milímetro em valores, princípios e sonhos!

Leia o resto deste post

CENA CONTEMPORÂNEA: EMICIDA VERSUS ALEXANDRE PIRES

Por Romero Venancio*

Acredito que muita gente deve ter tido noticia de dois acontecimentos um tanto periferericos no último final de semana. Um foi a “nova” música de Alexandre Pires onde negros + Neymar do futebel aparecem vestidos de macaco e e na própria letra há uma sugestão da relação. Música de péssima qualidade (bem a altura do compositor cabeça de vento e midiático). O ministério público se posicionou “julgando” insitação ao racismo. No sábado e domingo o dito cator teve espaço em horário nobre para se defender afirmando ser negro e contra o racismo. No programa “Fantástico” (titulo historicamente apropriado!) do domingo na rede globo, mais uma vez tava lá o Alexandre Pires e de novo dizendo que a música não f a z apologia ao racismo. Só que em nenhum momento ele entra no conteúdo da música e na “coreografia” (que já diz muito sobre racismo ou não). Lamentável e coerente a situação da música brasileira. lamentável pelo tipo de vulgaridade apelativa, pobre e preconceituaosa que embarca certos “gêneros musicais” nos dias atuais num País tão rico em ritmos e letras. Coerente porque este é o “estado da música hegemônica brasileira” contemporânea. Tola, pobre em coreografia (basta ver a “coreografia” sutil de M. Teló!!!) e com rara criativadade (para se ver o que significa criatividade na música, vejamos “Alquimistas do Som“, documentário sobre a música experimental no Brasil).

Segunda noticia. O rap Emicida foi preso no domingo acusado pela própria policia de belo horizonte de incitar a violência e desacato as autoridades (a mesma policia que sabe o que é respeitar ser humano pobre no Brasil! tem diploma disto). Na midia apenas a noticia de que ele foi preso e a razão da policia, obviamente. nada de sua fala, de sua defesa e da música em questão. Trata-se da inteligente “Dedo na Ferida“, onde o rap dedica aos muitos e muitos pobres deste Pais que são despejados de suas moradias onde ocupavam, crianças humilhadas e agredidas pelos mesmos educados policiais que prendem gente como Emicida e faz vista grossa para os Alexandre Pires da vida. A música indica como um dedo na ferida mesmo o seguinte: “Porque a justiça deles, só vai em cima de quem usa chinelo”. Precisa mais? Na verdade o que a policia prendeu não foi simplismente o rap, mas um tipo de música que fala e se coloca ao lado dos de baixo neste País profundamente injusto, perverso com os da “Senzala” (metafora mais que apropriada no dia 13 de maio!!!???). A “Casa-Grande” deste Pais não suporta as músicas (diga-se de passagem, bem construida esteticamente e sem apelação a cabeças de vento como Neymar ou a mulheres pelada s da midia pornográfica e moralista, ao mesmo tempo). Como muito bem diagnosticou o Psicanalista Tales Ab`Sáber no seu extraordinário ensaio sobre o Brasil contemporâneo “Lulismo: carisma pop e cultura anticrítica” (editora Hedra, 2011), o nosso debate atual esta completamente rebaixado pelo triunfo absurdo da “cultura anticritica” de entronização da irrelevância como norma. Como não acredito em dominação total, vejo em figuras como Emicida e na sua coragem e inteligência a esperança de termos sempre algo esteticamente contra-hegemônico nessa maré de lama e de mediocridade promovida que campea na cultura brasileira atual. Por fim e percebendo uma pequena ironia nessa história: ambos são negros, Emicida e Alexandre Pires. É fato notório. Mas um vem e se identifica com a “Senzala” o outro vive e se identifica com a “Casa-Grande” (midia hegemônica, revistas sensacionalistas, programa bobocas de auditório e por ai vai). Aqui esta a ironia e uma pequena a legoria da história do Brasil que chega aos nossos dias sem completar o seu “13 de Maio de 1888” e ainda na espera real do seu “20 de Novembro”.

*Romero Venancio é professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS)

Nota das Mulheres do Barricadas sobre a aprovação do aborto em fetos anencefálicos no Brasil

Em abril deste ano, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu pela aprovação do aborto em caso comprovado de anencefalia. Esse debate foi posto por uma ação movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde que se estendeu por cerca de oito anos.

 A doença é uma má-formação do cérebro e do córtex, impedindo à sobrevivência do feto em que muitas vezes, provoca complicações graves à saúde da mulher. No Brasil, a cada cem mil recém-nascidos, um é diagnosticado com a má-formação, colocando o país em quarto lugar no mundo com o maior número de casos.

 Atualmente, a legislação permite o aborto em caso de gravidez decorrente de estupro e risco à saúde da mulher. Com a decisão do STJ, se garante a ampliação do direito das mulheres, reflexo da luta cotidiana de feministas que marcham a milhares nas ruas e pautam o debate incansavelmente em busca de mudanças no país.

 Mudanças essas que já existem há décadas em inúmeros países. O aborto na França, por exemplo, foi legalizado em 1975. Na atual União Europeia, com exceção de Malta, todos os países não possuem penalização em situações controladas do aborto. O Brasil, desta forma, se encontra em uma das posições mais restritivas e configuram um quadro de retrocesso aos direitos das mulheres.

 Hoje, nos falta o debate em toda sociedade brasileira. Quando feito, é um debate interditado, posto apenas em momentos oportunos, como as campanhas eleitorais, para garantir o adendo da grande parcela que é os setores religiosos e conservadores. À exemplo disso, a atual presidente Dilma Rousseff assinou durante a campanha presidencial um compromisso em não debater pautas como o aborto e o casamento entre homossexual. Ou seja, quando são colocadas as questões das liberdades individuais, do direito da mulher ao próprio corpo, por uma cultura mais diversa e participação da sociedade civil nas tomadas de decisão desse âmbito, ele é feito de forma aquém e travada pelas figuras públicas, pelos meios de comunicação e pelo legislativo brasileiro.

 Porém, o aborto é uma realidade concreta. Anualmente, mais de um milhão de abortos são realizados no país e no mundo, esse número chega a 40 milhões, sendo que sua metade é categorizada como abortos inseguros. Essa realidade é cruel, deixando as mulheres no esquecimento aos olhos da sociedade.

 Os abortos inseguros são a segunda maior causa de mortalidade materna e isso é reflexo de um Estado que omite a responsabilidade na assistência á saúde da mulher, na ausência de políticas públicas que garantam o suporte daquelas que optam interromper a gravidez e na precariedade de auxílio para aquelas que preferem por serem mães.

 As mulheres devem ter direito por um atendimento à saúde integral com seus direitos sexuais e reprodutivos assegurados e amparados por quaisquer decisões tomadas. É necessária uma educação sexual presente, para prevenção da gravidez e DST’s, com a disponibilização de contraceptivos e anticoncepcionais nos postos de saúde pública. Assim, a defesa pela legalização do aborto e não apenas em certas circunstancias, é parte também de uma luta por uma saúde pública responsável e atenta a vida reprodutiva da mulher.

 Para, além disso, falar de aborto é tocar em um tema com relação direta aos direitos individuais e ao mesmo tempo a construção de uma sociedade democrática que tenha suas tomadas de decisões regradas pela laicidade. É a relação do direito da mulher sobre o próprio corpo no qual a decisão não é da Igreja, do Estado e de mais ninguém ao não ser de nós mesmas.

 Segmentos, sobretudo a Igreja Católica e Evangélica que constituem grupos autodenominados pró-vida, corroboram para o recrudescimento do conservadorismo, ao criarem, apoiarem e pressionarem ofensivas, como por exemplo, o Acordo Brasil-Vaticano, o recuo da pauta do aborto no PNDH3, a instalação da CPI do Aborto, a Rede Cegonha e o Estatuto do Nascituro. Assim, o progresso de uma legislação que contemple o direito ao aborto tem sido fortemente prejudicado pelo desrespeito à laicidade do Estado.

 A criminalização do aborto tem como vítimas as mulheres trabalhadoras e pobres, pois é essencial ressaltar, que na atual sociedade de classe que vivemos, mulheres que detém o poder são as mesmas que realizam o aborto em clínicas clandestinas de alto padrão e qualidade enquanto nós, jovens, negras e trabalhadoras somos penalizadas pelos métodos insalubres que nos restam quando feita a escolha por interromper a gravidez.

Assim, a luta pela legalização do aborto é romper com a atual sociedade de classes, sustentadas hoje pelo patriarcado e o próprio sistema capitalista, que se utiliza da dominação, interiorização e opressão sobre as mulheres para sua manutenção perversa.

A vitória mais recente das mulheres feministas, com a aprovação do aborto em fetos anencefálicos, faz parte desse extenso processo de emancipação genuína da mulher, que só será conquistado pela nossa persistência aos passos vastos de uma revolução aos moldes socialistas da sociedade.

Mulheres do Barricadas Abrem Caminhos

Tese ao V Congresso de Estudantes da Universidade Federal do Piauí